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Análise de Sociedade dos Poetas Mortos

  • Categoria: Critica de Filmes
  • Publicação: 04/07/2025 13:34
  • Autor: Felipe Haurelhuk - Meu Tio Cinéfilo

Título Original: Dead Poets Society.

País de origem: Estados Unidos.

Duração: 129 minutos.

Data de estréia (EUA): 9 de Junho de 1989.

 

Direção: Peter Weir.

Roteiro: Tom Schulman.

Elenco principal: Robin Williams, Robert Sean Leonard, Ethan Hawke, Josh Charles.

 

“Tradição, honra, disciplina, excelência!” São esses os quatro pilares que norteiam o ensino e a administração da Academia Welton, conceituada instituição de ensino que prepara seus estudantes a “ingressar nas melhores universidades dos Estados Unidos”. Todos os anos, centenas de estudantes secundaristas norte-americanos freqüentam as aulas da instituição, fortemente marcada pelo conservadorismo acadêmico, disciplinar e administrativo. Pais e professores depositam altas expectativas nos jovens, pressionando-os desde o primeiro dia por resultados em um modelo de ensino integral, no qual quase não há contato com o mundo externo.

 

Essa atmosfera de enclausuramento escolar é apresentada ao espectador logo na seqüência de abertura do filme, na cerimônia que inicia as atividades do ano letivo. Altamente formal, ela é conduzida por um dos diretores da academia em tom solene, sempre em consonância com sua centenária tradição. Na platéia, os pais assistem a tudo com satisfação e expectativa. Por outro lado seus filhos revelam um misto de medo, desconforto e conformismo. Entre os novos estudantes está Todd Anderson, interpretado aqui por Ethan Hawke ainda em início de carreira. Calado e retraído, ele se vê ainda mais pressionado pelo fato de seu irmão mais velho ter sido um dos destaques da escola anos atrás. Seu parceiro de quarto será o já veterano e popular Neil Perry (Robert Sean Leonard) que, apesar de possuir rendimento acadêmico ótimo, terá que lidar com o severo e controlador pai ao longo do filme.

 

Entre aulas maçantes e tediosamente fundadas sob uma mesma didática, eis que surge o novo professor de língua inglesa: John Keating. Eficientemente interpretado por Robin Williams, Keating propõe uma maneira diversa e não-ortodoxa de ensino. Logo na primeira aula, ele convoca a classe a observar os quadros de ex-graduados afixados nas paredes e evoca o “carpe diem”, expressão latina correspondente a “aproveitar o momento”. Contrapondo os dois elementos, o professor instaura ali não apenas sua maneira diversa de lecionar, como também desperta em todos aqueles jovens suas reais aspirações, seus desejos reprimidos, seus verdadeiros objetivos não-camuflados pelo autoritarismo acadêmico. E justamente por ser um catalisador de todo esse processo, conquista também a simpatia ímpar de toda a classe, que investiga a vida pregressa do docente.

 

Liderados por Neil, os garotos descobrem em um antigo anuário da escola que o então aluno John Keating fazia parte da “Sociedade Dos Poetas Mortos”, grupo que se reunia periodicamente para “extrair a essência da vida”, em reuniões que tinham como carro chefe a leitura de poesias. Entusiasmados pela idéia, o grupo resolve reativar as sessões e parte na calada da noite em direção a uma caverna incrustada no meio da mata que rodeia o prédio. Muito além da simples leitura de poesias, aquele passa a se tornar o espaço aonde os garotos libertam-se das amarras da academia Welton, de seu autoritarismo opressor e sua cobrança onipresente. Regados a poesia, os garotos desfrutam das sessões para extravasar suas personalidades em um ambiente escapista e antagônico ao qual são forçados a conviver diariamente. Indo mais adiante, é muito interessante notar o paralelo estabelecido aqui com a própria sociedade norte-americana, aonde a ideologia WASP (white, angle-saxon and protestant – branca, anglo-saxã e protestante) é contraposta aos elementos apresentados nas periódicas reuniões. Enquanto “honra, tradição, disciplina e excelência” são as bases de formação da opressora identidade nacional estadunidense, todos os elementos escapistas contrapõe-se a eles. Os cachimbos acesos, o material erótico, a degustação de álcool, a presença feminina em um ambiente restrito aos garotos, o entoar de cantos e até mesmo a pintura corporal acompanhada de instrumentos de percussão distanciam-se da identidade nacional WASP em um protesto implícito contra o status quo daquele sistema social.

 

Os prazerosos momentos vivenciados pelos garotos na caverna e encorajados pelo professor Keating começam a extrapolar os limites das próprias sessões em si. Assim, enquanto Knox Overstreet (Josh Charles) publica uma matéria não-autorizada no jornal interno protestando contra a ausência feminina em Welton e Todd supera gradualmente sua timidez, Neil passa a confrontar seu pai em busca do verdadeiro sonho profissional: seguir a carreira das artes cênicas. Naturalmente, tais transformações geram resistência e conseqüências múltiplas (algumas bastante fortes, inclusive), das quais não me aprofundarei para não estragar a surpresa daqueles que ainda não assistiram ao filme.

 

Peter Weir conduz as seqüências com muita consciência, em perfeita consonância com o excelente roteiro de Tom Schulman que, ao mesmo tempo crítico, também é pessimista. Crítico por representar a mentalidade de uma sociedade opressora e sufocante, regida por infindáveis regras e valores sob os quais cada um de seus representantes não tem controle ou atuação, apenas o conformismo. E pessimista por sugerir que mesmo a tentativa legítima de subverter essa lógica é inócua. No final das contas, o próprio sistema trata de anular essa tentativa em nome de sua própria sobrevivência e propagação.

 

Fluido em sua direção e intenso em sua temática, “Sociedade Dos Poetas Mortos” (Dead Poets Society. EUA, 1989) é um filme inteligente e que perpassa seu próprio tempo. Mais do que a atuação de cada um dos atores, da bela fotografia ou da direção de arte cuidadosa, o principal mérito do filme está na forma em que consegue ser crítico sem devaneios, costurando cuidadosamente os elementos de uma história que transcende seu próprio tempo e continua mais atual do que nunca. Excelente pedida!


Total de indicações: 4 (1 Oscar).

 

Melhor Filme – Steven Haft, Paul Junger Witt e Tony Thomas.

Melhor Diretor – Peter Weir.

Melhor Ator – Robin Williams.

Melhor Roteiro Original – Tom Schulman.